Blog Rocha 100
“No princípio, criou Deus os céus e a Terra”. Ótima frase para um Blog que navegará 100 fronteiras: dos céus metafísicos à “rude matéria” terrestre. “Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou”. Pois, somos também deuses, e criadores. Podemos, principalmente, criar a nossa própria vida, com autonomia: isto se chama Liberdade. Vida e Liberdade são de Deus. Mas, quem é “Deus”? Devotos hebreus muito antigos, referiam-se a Ele apenas por perífrases de perífrases. Para Anselmo de Bec, Ele é “O Ser do qual não se pode pensar nada maior”. Rudolf Otto, diante da dificuldade de conceituá-Lo, o fez precisamente por essa dificuldade; chamou-O “das Ganz Andere” (o Totalmente Outro). Há um sem número de conceitos de Deus. Porém, o que mais soube ao meu coração foi este: “O bem que sentimos intimamente, que intuímos e que nos faz sofrer toda vez que nos afastamos dele”. É de uma jovem filósofa: Catarina Rochamonte.
quarta-feira, 22 de agosto de 2012
Thomas Becket e o rei Henrique II - Joaquim Barbosa e o presidente Lula
Ocorre que o ministro foi indicado para o cargo pelo ex-presidente Lula.
Como se sabe, o ex-presidente tem o máximo interesse na absolvição dos seus protegidos mensaleiros. Chegou mesmo, o ex, à tentativa de chantagem sobre um membro da Suprema Corte.
Com efeito, o ministro Barbosa está pegando pesado com os réus da Ação Penal 470 (nome técnico do mensalão). Mas não por alguma predisposição, mas porque as provas dos delitos denunciados são robustas. Não fosse assim, se provas não houvessem, se fossem os réus inocentes, a predisposição do ministro se revelaria em um voto fraco, falho, ilógico e inconsequente. Mas, pelo contrário, vem se revelando um voto robusto, exato, lógico e consequente.
Contudo, onde fica o dever de gratidão do ministro Joaquim Barbosa para com aquele que o indicou (indicação que é quase nomeação, pois, no Brasil, muito dificilmente o Senado rejeita uma indicação presidencial)?
Não fica, não cabe, não cumpre. Uma vez no cargo, o ministro deve honrar o cargo.
Isso tem história. A mais célebre reporta ao século XII, e está referida no título. Foi transformada em romance, teatro e cinema. "Becket, o favorito do rei", filme de 1964 dirigido por Peter Grenville e com soberbas interpretações de Richard Burton (Becket) e Peter O'Toole (Henrique II), foi sucesso de público e crítica, premiado pelas Academias. Filme baseado em peça também famosa de Jean Anouilh.
Vai aqui um resumo da história, para os preguiçosos:
Henrique II Plantageneta, rei da Inglaterra de 1153 a 1189, tinha como melhor amigo Thomas Becket, a quem cumulava de favores. Henrique era um grande governante, deveras compenetrado dos seus deveres reais, o que não o impedia de ser um mulherengo incontrolável e farrista contumaz. Becket, que ajudava o amigo e protetor nos ofícios de governo, também o acompanhava nas farras costumeiras. Eram, como se diz, unha e carne. Eis que o rei vivia em litígio com a Igreja Católica, poderosíssima na Inglaterra e em todos os reinos da cristandade. No reino de Henrique II, o mais importante cargo eclesiástico era o de Arcebispo de Cantuária, Primaz da Inglaterra. O hábil Henrique aproveitou a morte do Arcebispo Teobaldo, seu desafeto, para colocar no seu lugar alguém que lhe fosse absolutamente fiel. O amigo escolhido foi, justamente, Thomas Becket, que, além de amigo fiel, provinha da Igreja e era homem culto e refinado (os nobres de Henrique eram, quase todos, analfabetos e brutos). Pois ocorreu que Thomas Becket, uma vez no cargo, honrou o cargo. O novo Arcebispo de Cantuária mostrou-se exemplo de devoção e defensor intrépido das prerrogativas da Igreja. Cumpriu integralmente aquilo que considerou ser seu dever, sem fazer qualquer concessão a seu antigo amigo e protetor, o rei. Em consequência, o rei ordenou o assassinato do Arcebispo. Ou assim entenderam alguns daqueles nobres ignorantes e brutais que faziam a corte de Henrique. Consta que o rei Plantageneta, ao sofrer mais um revés nos seus confrontos com o Arcebispo de Cantuária, teria dito, na presença dos seus nobres: "Não haverá quem me livre deste padre Turbulento?". Quatro dos mais brutais daquele nobres cavaleiros (verdadeiras cavalgaduras) levaram o desabafo do rei ao pé da letra, seguiram até a Catedral de Cantuária e assassinaram o Arcebispo ao pé do altar da capela-mór. A gente inglesa, maciçamente, responsabilizou o rei e começou a cultuar o Arcebispo assassinado como mártir cristão. O clamor foi tão forte que o poderoso rei Plantageneta, sentindo seu trono vacilar, peregrinou até Cantuária para fazer-se flagelar ao pé do túmulo do Arcebispo. Pouco tempo depois da humilhação real, Thomas Becket, apenas três anos depois do seu martírio, foi canonizado: virou São Tomás Becket. Está no Céu, em beatitude; enquanto Henrique Plantageneta queima na grelha do capeta, lá na sucursal infernal do purgatório (direto para o inferno, Henrique não terá ido, porque seu reino, em vários aspectos, foi benéfico).
E aí, gostaram da história? E a comparação, é procedente? Eu mesmo lhe vejo uma extensa falta: Joaquim Barbosa foi indicado ministro do STF pelo então presidente Lula, mas não eram amigos, sequer se conheciam pessoalmente. A comparação melhor se aplicaria aos ministros Ricardo Lewandowski, indicado por Lula por recomendação da Primeira-Dama Dona Marisa, amicíssima do ministro e da família do ministro. Ainda mais pertinente será a comparação com Dias Toffoli, amigo fiel e protegido do então presidente Lula, quando da indicação. Ocorre que o que pretendi ressaltar aqui foi a já referida obviedade, esquecida pelo fanatismo político-partidário: cumpre ao funcionário, em quaisquer circunstâncias, honrar o cargo. Gratidão não é figura de direito publico. Também, o ministro em evidência até hoje (22/08) de manhã, quando comecei a redigir esse texto, era o ministro Joaquim Barbosa. Agora à tarde, começou a ser focado o ministro Lewandowski, que iniciou seu voto.
Pois, de hoje de noite para amanhã de manhã, farei a comparação entre o amigo de Henrique Plantageneta e o amigo de Dona Marisa. Na sequência e oportunidade, farei a comparação mais pertinente: entre o amigo do coração de Henrique II e o amigo do peito do presidente Lula.
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